segunda-feira, 4 de abril de 2016

Serial Killer / Opus 1



Somos feitos do mesmo tecido que constitui a madrugada, você e eu:
Roído, remendado, manchado de sonho e embriaguez.
Eu espreito o barulho que os seus sapatos produzem contra o asfalto enregelado: night stalker.
Volta e meia, você olha para os lados. Em cada esquina você aperta o passo,
Breves olhares desconfiados, enquanto se dirige para longe da calçada.
Seus braços cruzados sobre seu peito carregam um casaco escuro; sua bolsa pendurada sobre um ombro,
Seu descuidado esquadrinhamento do perímetro morto que a cerca se pendura sobre os dois ombros,
Fazendo-a curvar-se ligeiramente sob a tensão de estar vulnerável em horas desmaiadas, que de longe precedem o nascer do Sol.

O que faz uma moça bonita assim tão sozinha, tão assustada na calada da noite? - eu me pergunto.
Você gostaria de ter a certeza de que está invisível sob o manto escuro de Nix, mas - pálida ironia - eu a observo. Você não é invisível para mim;
Pelo contrário: brilha como diamantes sob o Sol.
A forma de suas curvas se insinuam, ainda que involuntariamente, sob esse vestido preto apertado.
De você emana uma sensualidade assustada, porém duradoura, como uma onda que banha uma ilha nua e desolada. Uma espécie de Dália Negra.
Outras antes de você já estiveram diante do impassível delirar dos meus olhos. E outros.
E todos tombaram.

Olhe para os lados enquanto caminha, bela dama da pele ebúrnea, ostentando o frescor agradável das loiras. Serão seus olhos claros? Escuros?
Em breve, de brilhantes eles se farão opacos. De assustada você se fará desmaiada de pavor.
Porque eu sou a noite; eu sou a mão escura, sou o vórtice vermelho que molhou as ruas de Whitechapel, sou a insensatez de Dahmer, Ramirez, Gacy, Bundy.
Eu crio o terror e a noite é negra; nela os medos proliferam-se como larvas em carne podre.
Eu sou criado pela cultura pop: procuro fazer da minha efemeridade algo eterno. Olhe para os lados, mas não olhe para trás.
Eu a observo na calada da noite. Eu sou o seu after party.

[ ... ]

A avenida adormecida continua desenrolando-se sobre o clac dos seus saltos. Clac clac clac, tacones lejanos. Dou partida no motor, estou indo encontrá-la.
Eu realmente gosto disso. Você vai me convidar para entrar quando a hora chegar?



domingo, 3 de abril de 2016

Hollywood Depois da Meia-Noite



A pressão das suas mãos contra as minhas costas nuas, aquele arquejo: eu me sentia transportado para Hollywood.
Um convite à insensatez, ao desregramento, à demolição completa, a me ajoelhar perante os altares vacilantes do ego.
"Eu te vejo", era só o que eu podia ouvir do seu balbuciar em meu ouvido, que parecia eterno, mesmo durando o tempo de uma batida de coração.
Palmeiras silenciosas, céu sempre azul, avenidas abertas; suas unhas vermelhas quebrando-se contra a minha pele, lábios escarlates.
Eu me desfazia em todo aquele blues, era consumido pela chama de cada jazz que tocava em cada esquina mal iluminada por um neon prestes a se apagar.
Álcool, fumaça de cigarros, onde o ilícito sobejava e onde eu aspirava pelo ilegal. Você me dizia que deveria ser ilegal despedaçar assim o coração de uma mulher.
Cabelos louro-platinados a la Jean Harlow, Golden Age, golden tragedies. Eu costumava gostar disso.
Sirenes cortando a madrugada morta de LA, a Mulholland Drive tão sinuosa quanto as curvas dos seus quadris.
Minha Joan Crawford, minha Bette Davis, minha Lauren Bacall. Meu paraíso e minha sombra que se esgotava por entre as noites dissolutas e faiscantes.
Like my body? Want some money? Wanna play? Want a vi-per? Dentes à mostra, mostre-me mais. Mostre-me o seu sangue, essa torrente escarlate que manchou tantas banheiras aleatórias.
Dissolva-me nesse abraço eterno, que dura uma batida de coração. Deslumbre-me com todas as cores que a sua escuridão pode forjar.
Beba de mim e viva para sempre - as estrelas não envelhecem, ¿verdad?
Viveremos de devastação e luzes brilhantes enquanto você ainda puder me enxergar. Por um breve instante imemorial. Enquanto nós ainda formos bem-vindos em Hollywood.