segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Um Instante Impressivo.



Vi um hippie-chic na rua hoje, encontro estranho.
Ele não fazia malabarismos e não vendia artesanato.
Vestia Giorgio Armani e exibia um anel brilhante em seu mindinho.
Usava uns óculos alternativos e carregava um violãozinho surrado.
Olhou-me com uma fome animal, quando passou por mim,
Luxuriosa, quase desesperadora.
Não lhe dei nenhuma moeda. Não lhe vi os olhos.
Vi-o mais tarde: acho que ele vendeu o tal anel para almoçar aquele dia,
Ou deixou-o em alguma alcova, quem sabe,
Alguma que eu nunca saberia onde encontrar.

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Por Raphaël Crone.

Emboscada.

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[ Eu vou te perseguir,/ Te esfolar vivo,/ Mais uma palavra e você não sobreviverá./ Eu não vou aliviar sua dor,/ Eu não vou acalmar sua tensão./ Você vai esperar em vão,/ Eu não tenho nada que você queira. ] * [ Blue Foundation ]


Observo a noite densa e silenciosa por detrás de um poste ambíguo,
Luminária e esconderijo, eis a sua serventia.
A cidade é engolida pelas brumas, hora após hora,
Torna-se tão vaga quanto Silent Hill. Sangue e gás.
De onde sairá você, Pyramid Head?
De onde virá o primeiro golpe inesperado? Ainda não tenho olhos nas costas, evolução medíocre.
Um pouco de cultura pop em meio ao silencioso assombro da névoa.

Eu espreito a sua passagem como o gato espreita o rato,
Com os olhos em chamas, fascinantemente vidrados.
Ao longe, ouço alguns tons de música, sons de instrumentos sintéticos e de voz arrastada.
Canções de fantasmas melancólicas, eróticas, quase realmente amedrontadoras.
Drácula deve rondar esta região nesta noite.
Que ele não me encontre nesta rua hoje (calafrio, calafrio),
Não hoje, que procuro por você. É meu dia, não o seu e não o dele.

Coloco uma das mãos frias no bolso, acendo um cigarro.
Misturo a fumaça com a bruma, liquidificando a sensação de perda.
Uma perda gasosa, heterogênea,
Onde cada parte se esvai sem pedir licença ou sem dar um aceno de adeus.
Com a fumaça se esvai meu temor e minha memória,
A não ser a sua face, esta ainda permanece comigo.
Permanece, por que preciso reencontrá-la nesta noite.

Não há vozes, não há passos, não há definitivamente Pyramid Head.
Esta cidadezinha que assombro me assombra dramaticamente.
Gela-me a espinha e sussurra-me coisas incoerentes
Em ouvidos que nem eu sei onde exatamente ficam. Time to go.
Abandono a ambiguidade do poste que me oculta.
Agradeço aos fantasmas que cantaram para mim, que embalaram a minha espera.
Resigno-me e parto. É hora de lhe caçar. É hora de lamber os dedos novamente.

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Por Raphaël Crone.