sábado, 27 de abril de 2013

Vinheta Quebrante



Quando eu ouço sua voz cantando na área de serviços,
Enquanto lava roupas,
Sinto minha alma amolecer, mulher.
Sinto ela dançar.
Ela dança e rodopia, embalada pelo pensamento das suas cadeiras,
Das suas voluptuosas curvas por baixo desse vestido caseiro
E dos seus dentes de pérolas, que nem Bizet conseguiu musicar melhor.

Minh'alma dança uma vinheta quebrante, cheia de calores e ardores,
Onde cada nota tem cheiro, e cheiro da sua pele,
Cheiro dos seus cabelos loiros presos em um coque frouxo,
Cheiro de paixão que você, mulher, enfiou aqui dentro do meu peito
E que eu nunca mais, depois disso, fui capaz dali tirar.

___
Por Raphaël Crone

Vinhos e Colchas de Retalhos



Hoje eu acordei em meio a retalhos.
Uma grande colcha de retalhos dentro da minha cabeça confusa
Como que me sufocava, enquanto eu voltava à superfície.
Nela, pensamentos cosiam-se a pensamentos desconexos,
Atados, indolentemente, pela agulha afiada da memória.

Em algum lugar do quarto havia um rádio ligado
E ali os Scorpions tocavam, em repeat, "Still Loving You".
Olhei para o lado da cama e não te vi.

Cobri minha mente novamente com a colcha informe de memórias
E mais uma vez dormi.
Um mergulho no vinho da inconsciência,
Meu santo remédio contra a falta de você...

___
Por Raphaël Crone

Estação das Bruxas



Madrugadas sombrias, onde as sombras tomam vida,
Onde elas se movem e dançam pelas paredes do quarto.
Fantasmagorias que confundem os olhos e entorpecem os sentidos,
Terrores noturnos.
Flashes de neon em meio ao breu da asa da graúna,
Olhos vermelhos na escuridão atrás da porta:
A estação das bruxas que chega quando o sino bate três após a meia-noite...

___
Por Raphaël Crone

Antes do Amanhecer



A luxúria se move nas sombras.
Ela nasce do mais recôndito espaço que existe entre suas sinapses,
Furtivamente esgueira-se por entre as rugas de sua testa
E o único vislumbre que ela dá de sua chegada é o brilho momentâneo em seus olhos semicerrados.
Então, ela chega e me consome, me devora:
Pele, músculos, braços e interiores,
Dimensões de abrasador desejo vermelho onde me arrojo.
Depois ela se vai, silenciosa como veio, marcada apenas por um rouco arquejo,
Nebulosa como a fumaça do meu cigarro que permanece após o alvorecer,
Que surge e nos abraça em incandescente fúria...

Passagens que uma manhã não testemunhou.


___
Por Raphaël Crone

Uma Dicotomia



E eu me contraponho em luz e sombras,
Pois minha escuridão me inunda como o sol invertido à meia-noite.
Dentre as louras madeixas que me pendem 
Tintas escuras me tingem e tonalizam: profundidades abissais,
Existencialismos mesurados, olhos que espreitam
E pés que se apressam em correr sob a capa da noite...

___
Por Raphaël Crone