sábado, 30 de maio de 2009

Introduzindo-Me: Segredos.

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[ Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro. ] * [ Clarice Lispector ]

[ Minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem de grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite. ] * [ Clarice Lispector ]

[ Quanto mais me despedaço, mais fico inteira e serena. ] * [ Cecília Meirelles ]


Contradigo-me: profundamente e repetidamente contradigo-me.
Ambulantemente e espalhafatosamente.
Em certos momentos, isso me traz certo orgulho bobo:
Faz-me sentir vivo, rebelde. Quase que revolucionário dentro do meu mundo.
Mas na maior parte do tempo isso me frustra,
Me faz duvidar e perder tempo que não tenho a perder.
Gostaria de escrever, mas pouco escrevo
E gostaria de desenhar, mas nunca pego papel e grafite.
Gostaria de cantar e encenar e pintar,
Mas nunca tomo grande atitude para expandir a minha Arte,
Que é essencialmente bela e potencialmente devastadora.
[ ... ]
Gostaria de revolucionar o mundo, nem que fosse o meu próprio,
Com coisas que eu bem sei fazer,
Mas não o faço; guardo a minha Arte quase toda pra mim
Como se o mundo exterior não precisasse dela
(E de fato, muitas vezes me questiono se ele realmente precisa).
Contradigo-me: faço o que não gosto e o que gosto, pouco faço.
Gostaria de fazer mais, mas os monstros que moram dentro de mim exteriorizam-se quando resolvo abrir-me,
Tenho medo do que mora em meu armário. Dos gigantes que assolam as planícies do meu self.
A minha Arte transporta-os para os olhos alheios.
Poderia-se especular que talvez um dos motivos pelos quais pouco uso minha Arte-Musa seja justamente este:
O medo de que ela exponha mais do que eu gostaria de expôr,
Mas garanto-lhe, leitor, metalinguísticamente: Não é.
Na realidade, sinto um mórbido prazer em despir-me de meus acertos e falhas perante as palavras e imagens de minhas obras,
Sinto prazer em mostrar que sou feito de deliciosa e inescrupulosa humanidade,
Sem intenções de perfeição ou santidade, sem buscar o Paraíso.
Talvez o real motivo nem eu conheça: indolência ou egoísmo, sabe-se lá.
Quem sabe o que se esconde aqui dentro, o que me motiva?
Nem mesmo eu bem sei, leitor.
E no fim, quem sabe não seja melhor que assim mesmo o meu eu-incomum continue?
Justamente assim: despudoradamente oculto e entre sombras se revelando.

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Por Raphaël Crone.

Um comentário:

André disse...

Tão fantástico como só você sabe ser!

Os textos que abrem o post fizeram a perfeita ligação entre as suas percepções e o cerne do texto!

Perfeito, Raphäel, perfeito!