sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Uma Recordação Minha.

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[ Se deus fulmina os erros da ternura,/ Uma lágrima só lhe apaga o raio. ] * [ Manuel du Bocage ]
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[ Mas alguém me disse que você ainda me ama,/ Será isto possível? ] * [ Carla Bruni ]


Como Julianne Moore em "As Horas",
Chorei quando lhe dei as costas naquela rodoviária,
Após um abraço terno e um sussurro terno
E não olhei pra trás quando você subiu naquele ônibus velho.
Chorei durante todo o caminho pra casa,
4 da tarde, ruas cheias;
Resolvi tomar um banho longo
E mal via que o sabonete dissolvia-se por ação da água que teimava em cair do chuveiro,
Enquanto eu, convulsivamente, chorava deitado no chão do banheiro.

Chorei a sua partida, com uma dor tão vívida
Que me sentia faltar o ar, era difícil respirar.
Chorei a sua partida,
Chorei a parte de mim que ia contigo,
Mas a parte de vocêzinho que ficou comigo, então, me consolou.
Me consolaram Maria Callas e Edith Piaf,
Borges, Drexler, Camille,
Fui consolado pela torrente violenta que banhava meu coração de lembranças,
E que me fazia enxergar-lhe em toda parte;
Fui consolado por "Non, je ne regrette rien".

Apenas um menino lindo", palavras suas;
De fato você me faz sentir um menino lindo,
Como é linda a homenagem que a Carla Bruni me faz através do seu amor;
Amor, enquanto nós bebíamos e conversavámos naquele bar da praça matriz de cidade do interior,
Amor, denunciado por nossos beijos nas ruelas escuras,
Amor em francês, em espanhol,
Amor latino-americano.
Amor, enquanto eu lhe assistia dissertar na faculdade
E você me assistia lecionar, após a chuva;
Amor, em tardes quentes e companheiras;
Amor, enquanto faxinávamos a casa,
Enquanto aprendíamos a lavar roupa,
Enquanto conversávamos à toa na janela da vizinha.

Amor, enquanto você deitava no meu colo naquela pracinha
E nós chorávamos como crianças,
Apenas por causa desse tal de amor,
Que justifica todas as dores e prazeres de nossas existências;
Amor, em madrugadas longas,
Enquanto acompanhavámos um ao outro de volta pra casa,
Amor musical e poético,
Amor sentimental.
Amor, como o que a Adélia Prado tem pelo Zé e seu fusquinha,
Amor camarada e bom,
Amor amável;
"Te amo, homi", a Adélia dizia pro Zé; e eu lhe amo.
Mesmo sabendo que sem você, este lugar é como Londres,
Chove todos os dias
E que eu sou apenas metade de um corpo, sem o seu abraço.

Amor, que sabe que semana que vem a gente está junto de novo,
E que toda a choradeira foi porque eu não queria ficar nem um dia sem lhe ver;
Amor, que eu enxerguei no fundo dos seus olhos,
Amor mais amplo que palavras,
Amor romântico e revolucionário,
De mãos dadas na praça;
Amor, que me faz esquecer de mim mesmo,
Apenas pra lhe ver feliz, como você me faz feliz,
Amor acordado, amor dormindo, amor de todo quanto é jeito;
A Julieta tem mesmo razão, lhe quero com limão e sal,
Lhe quero falante ou não, lhe quero e lhe tenho
E você me tem também,
Um menino que chora na rodoviária e que lhe ama cada momento mais;
Que adotou a bermuda que você lhe deu como um uniforme,
E que alegremente espera por você,
Como Penélope esperava por Ulisses naquela praia.

[ Minha mãe cozinhava exatamente: arroz, feijão-roxinho, molho de batatinhas.
Mas cantava. ]


Sou eu quem lhe agradece, amor.
Ton garçon, qui t'aime beaucoup et toujours.
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Por Raphaël Crone.

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