terça-feira, 2 de abril de 2013

A Roda do Ano




Naquela escura noite de outono, eis que a Mãe desce ao submundo para resgatar o seu Consorte,
O Deus Cornífero, tomado pelos braços da morte repousa inerte.
Nas terras do Hades, a Mãe retoma o poder sobre a morte e uma criança passa a viver em seu ventre,
A esperança da Terra, o desejado pelas nações.
Sons de harpas e vozes ecoam pela noite, fogueiras são acesas,
A esperança de todo um povo descansa nas mãos da Mantenedora.
"Aqui está o meu coração, eu o entrego a você,
Leve-me contigo através desta terra..."
O véu que separa o mundo dos vivos e dos mortos se torna tênue, frágil,
Lanternas são levantadas em meio às florestas de carvalhos e danças celebram o sacrifício do Deus Pai:
O Samhain anuncia o inverno que se aproxima, onde a noite fria guardará os corações dos homens em seu regaço...

Eis que no auge no inverno, em pleno solstício, o Deus renasce como um bebê,
Indefeso, esperado, desejado, acarinhado pelos braços de sua Mãe Imortal.
"Estes são os meus sonhos, tão simples, tão poucos,
Sonhos que carregamos nas palmas das nossas mãos..."
Na noite mais escura, em Yule, o Pai vem ao mundo para renovar as esperanças dos homens;
A neve e o vento agreste lhe dão boas-vindas, o branco impera e a escuridão se prolonga.
Árvores nuas, rios congelados, a vida em estado de hibernação, aguardando um novo recomeço.

O Deus-criança começa a crescer, espargindo sua graça pelo mundo:
A terra começa a recuperar-se do inverno que se despediu.
O sol começa a surgir tímido e o vinho e as flores celebram o despertar dos campos:
Uma nova primavera se aproxima.
Em Imbolc as vozes começam a se erguer rejubilantes,
O aroma dos jasmins inunda o ar e os tambores são despertados pelos homens com esperança renovada.
Brigit, lembra ao mundo que sua tríplice face carrega a sabedoria da vida:
Nos braços da Donzela, o mundo é acariciado, no ventre da Mãe o mundo é partejado e fertilizado
E nas mãos da Anciã, o mudo e tudo o que nele há, repousarão afinal.

A primavera espalha pelos campos flores de cores mil, aromas doces de saudades que se dissipam.
No primeiro dia de sua chegada, em pleno equinócio, eis que a terra desperta,
Preparando-se para dar frutos em centenas e milhares para os que dela esperam sustento.
A fertilidade da vida é celebrada, ovos pintados e coelhos acompanham a gentil Eoster
Em sua caminhada santa, abençoando aqueles que buscam renovação e abundância.
Ostara nos ensina a trabalhar pelo muito, mesmo com o pouco em mãos,
Pois aquele que no pouco é fiel, no muito será assentado em glória.

Eis que a roda continua girando e os primeiros raios do sol forte inundam os olhos dos homens:
Nas noites cálidas que prenunciam o verão, as fogueiras de Beltane são acesas nos campos.
O mais alegre dos Festivais derrama pelo chão os fluídos que fecundam o solo,
Fazendo-o glorioso e frutífero, qual ventre da Mãe aberto à vida, de onde ele nasce e que a ele consome.
A energia e a luz de Bellenos se avolumam, o Deus cresce em graça, força e sabedoria
E enche a Terra com a sua glória sempiterna.
O pão para os homens, que lhes sustenta a carne e o vinho, que lhes alegra o espírito é concedido,
Gritos de felicidade cortam o ar das noites sem fim.

Eis que o Pai alcança o auge de sua glória, o Deus agora é radioso novamente,
O sol está a pino, no meio do céu e tudo é inundado de dourado e vermelho.
O verão se anuncia e chega com todo o seu esplendor, onde os corações dos homens contemplam satisfeitos as obras de suas mãos.
A abundância e a exuberância são os encantamentos regentes no solstício e o Deus agora, pai dos grãos e da fartura, espalha pelo solo sua generosidade.
O encontro de amor do Pai e da Mãe em Beltane começa a render frutos e a graça e a paz alcançam os homens que desejam a justiça.

Llughnasad se apresenta, anunciando o outono que se está a caminho,
Abençoadas sejam as foices que ceifarão os campos e colherão as messes da terra!
O amor da Mãe e a benção sem-par do Pai fecundaram o mundo e a Primeira Colheita é celebrada com cantos e júbilos.
Das primícias, os Deuses recebem o melhor punhado
Em agradecimento pela generosidade, em sinal de desprendimento e gratidão.
Os campos já estão marrons, prontos e chamam aqueles dispostos a deles retirar os preciosos frutos de mais um ano: os céus alimentando os homens por mais uma vez.

A preciosa cornucópia está agora cheia: o chifre repleto de fartura e cânticos de louvor;
O descanso da labuta é chegado e a celebração é farta e ruidosa.
Capas ululam contra o vento em Mabon, homens que vem e vão floresta adentro e afora,
Os mantimentos estocados para o novo inverno que está a caminho.
O Deus começa novamente a definhar, a roda está quase completando seu ciclo
E em breve ele deve novamente ao submundo retornar.
A Deusa pranteia seu esposo e as lágrimas de sua tristeza molham a terra uma vez mais.
Novamente ela descerá ao hades, para que por amor ao mundo, uma criança seja gerada
Na noite fria de Yule, trazendo esperança aos homens de bem e fartura aos homens de boa-vontade
Até a consumação dos séculos enfim...

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Por Raphaël Crone

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